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Recife em Transformação

Boa Viagem: de área rural ao bairro mais verticalizado do Recife


O bairro – classificado como área rural na legislação de 1936 (Decreto Municipal nº 374) – registra a maior verticalização da cidade da década de 1970 para os anos 1990, diz Virgínia Pontual. “Havia uma predominância de casas térreas e prédios de no máximo quatro pavimentos em Boa Viagem nos anos 70. Isso se inverte nos anos 90, com concentração de edifícios de mais de dez pavimentos.”

Para se ter uma ideia, 22% das moradias da orla eram casas térreas em 1970 e 40,12% correspondiam a prédios de dois a quatro pavimentos. Os edifícios de cinco a dez andares representavam 24,58% das ocupações e os imóveis com mais de dez pavimentos somavam 13,31%. Da Rua dos Navegantes em direção à Avenida Domingos Ferreira, as casas respondiam por 70,81% da ocupação e os prédios acima de dez andares não passavam de 2,01%, informa a arquiteta.

Em mapa de 1932, a Ilha do Nogueira já aparece identificada como Pina, ocupada por uma população mais pobre, formada por pescadores. A construção do Cassino Americano durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) é responsável pela valorização da localidade, afirma Virgínia Pontual. “O esgoto da área urbana do Recife saía da Usina da Cabanga, num emissário, para ser despejado no mar do Pina. Por isso, nos anos 20, 30 e 40, o Pina não era lugar de banho de mar, como Boa Viagem”, observa.



O Pina teve um crescimento mais lento, informa a arquiteta. A população passou de 36.016 habitantes em 1970 para 40.989 pessoas em 1980 e 42.291 habitantes em 1990. Hoje verticalizado, o Pina era formado basicamente de casas térreas em 1970. “Oitenta e quatro por cento das construções tinham até um pavimento e 16% eram habitações de dois a quatro andares. Não havia nada mais alto que isso”, comenta a arquiteta.

Brasília Teimosa, vizinha do Pina, só iria surgir em meados dos anos 1950 com a ocupação de uma área destinada ao Parque de Inflamáveis do Porto do Recife. O parque previsto nunca chegou a ser instalado e ali nasceu a mais antiga invasão urbana da cidade. Os moradores eram frequentemente despejados e as casas destruídas eram novamente erguidas. Como o derruba e levanta acontecia na mesma época da construção da futura capital do País, a comunidade recebeu o nome de Brasília Teimosa, informa Virgínia Pontual.


Foto aérea da região de Brasília Teimosa. Foto: Acervo JC Imagem

“Sou da época da fundação de Brasília Teimosa, moro aqui há mais de 50 anos. As casas de tábua eram derrubadas pelo governo e a gente levantava tudo de novo quando eles iam embora. Isso aqui era um areal, não tinha pista nenhuma, eu vi a abertura das ruas para os carros”, recorda Maria Rita da Silva, 74 anos, que vendia bebidas na praia para sustentar a família. Urbanizada, Brasília Teimosa ganhou uma orla em 2004 (Avenida Brasília Formosa) e tem status de bairro.


Recife em Transformação

O nascimento e a evolução da Avenida Boa Viagem


Se um bairro pode ter certidão de nascimento, Boa Viagem ganhou o seu registro em outubro de 1925 com a inauguração da avenida à beira-mar. Até então uma vila de pescadores, um pequeno povoado próximo da atual igreja da pracinha, as terras distantes ao Sul do Recife começam a se conectar às áreas urbanizadas da capital com a abertura desse caminho para a circulação de bonde e carros.

“A Avenida Boa Viagem abre o Recife para o mar e cria um novo bairro”, declara o professor da graduação e da Pós-Graduação em Desenvolvimento Urbano da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Fernando Diniz. É na década de 1920, diz ele, que as cidades brasileiras descobrem o mar como opção de lazer e o Recife segue a tendência, como fez o Rio de Janeiro com a criação da Avenida Copacabana.


Fernando Diniz, arquiteto e urbanista da Universidade Federal de Pernambuco. Foto: Guga Matos/JC Imagem

Símbolo da modernidade, Boa Viagem surge num novo período de expansão da cidade, promovida por Sérgio Loreto, governador de Pernambuco de outubro de 1922 a outubro de 1926. “A ocupação era diferente do modelo de sobrados existentes no Centro e privilegiava o automóvel, a orla de Boa Viagem nasceu para os ricos e sob o signo do automóvel” afirma o arquiteto e urbanista Fernando Diniz.



Dos anos 50 até a década de 1990, a ocupação da orla passou por grandes mudanças. “O acervo ainda existente na avenida é magnífico, a lei permitiu a construção de um conjunto harmônico de edifícios que tinham relação com rua, como se vê nas imediações da Padaria Boa Viagem”, observa o professor. “Em menos de cem anos, a orla atravessou vários processos de substituição de suas edificações”, acrescenta.

A beira-mar de Boa Viagem chega ao século 21 como a área mais verticalizada do Recife e com a predominância da arquitetura contemporânea, marcada por prédios muito altos e fachadas revestidas de vidro. Morando na Avenida Boa Viagem desde 1996 – e no bairro desde 1988 – o historiador Marcus Carvalho, 60 anos, acompanha as transformações na paisagem há três décadas.

Ele viu casas e prédios baixos serem substituídos por espigões, após a aprovação da Lei de Uso e Ocupação do Solo nº 16.176 em 1996. “O que mais me impressiona no bairro é como os edifícios cada vez se parecem mais com fortalezas. Os muros são altíssimos, às vezes até com duas linhas de muralha, guarita e multidões de porteiros”, diz Marcus Carvalho.


Boa Viagem é considerado o bairro mais verticalizado do Recife. Foto – Guga Matos – JC Imagem

Uma paisagem bem diferente das construções dos anos 50 e 60, com muros baixos e maior interação do prédio com a rua, compara Fernando Diniz. “Agora, como praia de cidade, Boa Viagem é belíssima”, declara Marcus Carvalho. Só falta os governantes ampliarem a oferta de transporte coletivo para democratizar mais ainda o acesso a um dos poucos espaços de lazer público da cidade, observa o historiador.


Expediente

8 de abril de 2018

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